Monday, October 29, 2007

Delicatessen.

De coração tranqüilo e vago.
É buraco. Vazio. Um vácuo.
Vai botando coisas no lugar.
Fazendo bagunça dentro de si.
Preenchendo-se de pequenos prazeres incertos.

As pessoas não devem querer continuar.
Não devem nada, além daquilo.
E da conta que vamos dividir.
O Estacionamento, eu pago, uma gentileza.
É contribuição por conta da casa que você não vai conhecer.

Não querem precisar dela, que não parece precisar deles.
Aceita: tickets, chicletes, balas de revolver de açúcar.
Momento doçura.
Enchendo os olhos d’água como fazia na infância
com as piscinas de plástico.
Verão.
Paciência.
Fazendo-os transbordar e gotejar de canto, devagar.
Vai vestindo azul, vestido novo que acabou de sair da máquina.

Luiza definitivamente não sabe sentir assim.
Ela acorda feliz.
Faz rebuliço no ar.
Pula com graça os degraus da escada, diariamente.
Faz, do mais comum dos gestos, um ritual de passagem.
Vai equilibrando-se na guia da calçada.
Ouvindo o barulho da rua, divertindo-se com a poeira local.
Percebendo as cores, as novidades. A chuva. Belezas.
Descobre que a garoa embaça a paisagem e deixa tudo muito mais bonito.
Mais poético.

[Como a vela de aniversário
que a nova amiga (que ela não teve medo de conhecer)
colocou no brigadeiro de alguém especial,
tentando tornar aquele instante infinito].


Tem pensado nas pessoas que são especiais e fugazes.
Nos momentos ternos e não eternos.
Sabe que algumas delas só devem durar o tempo necessário.
Curto.
Que esgotam.
Mas questiona- se e não sabe se é por saudade.
Invade.
De dúvidas. Tramas. Derrame de palavras levianas.
Ela destoa com a falta de fisicalidade. Gratuita violência.
Subestima a dor. Ignora-a.
E chega à conclusão de que realmente não serve para isso.
E que, realmente vale à pena.
E mais, que tem dado um valor às palavras,
tanto escritas quanto faladas, que nem sempre elas têm.
O valor é dela.
Que és incapaz de magoar um coração.
Responsabiliza-se pelo buraco vazio, pelo vago vácuo corpo ao lado.
Não quer enganar.
Projeta tudo, menos o olhar nos olhos dele.
Já os outros olham.
Sempre mais espertos, mais sabidos,
mais vividos, cheirando as dúvidas dela, a divagar.

[Por que sorri assim esta menina que não tem nada nem ninguém?]

Mas ela tem.
Na consciência que se estiver para sempre, infinitamente,
com os lábios meio esticados de um canto a outro,
a vida de todos ficará mais fácil.
E ela quer facilitar. Desmistificar.
Dar calmaria às relações, sejam elas quaisquer.
As noites são claras.
Os dias já têm suficiente dificuldade.

Mais.
Foi numa terça que conheceu Sr. Augusto,
alfaiate de 82, em atividade no seu andar.
Parece-me que a identificação fora imediata.
Os dois tornaram-se grandes amigos, confidentes.
Ele entrou para a turma do 8 dela.
Ela pagou um café em troca das palavras doces e
das mãos ágeis daquele senhor, que alinhavou frases impecáveis.
Era tudo de que precisavam.
Costuraram com vermelho as longas histórias dele.
Ela sonhou em um dia narrar contos assim.
Usaram a fita métrica para medir o amor incondicional praticado.
Dentre os tecidos, linha e tesoura.
Moldes novos.

Fez fôlego.
Suspiro.
Foi tão doce que provocou arrepio.
Alívio.
E continuidade para aquela tarde intranqüila.

3 comments:

Adriane Hagedorn said...

� sempre muito bom fazer bagun�a dentro de si. este � um dos pequenos prazeres que merecem entrar para a lista.

e tbm a piscina de pl�stico, que ficaria muito bem instalada aqui na sala de casa. em frente � tv, para assistir a filmes e se refrescar nas tardes de ver�o. e depois de sair da �gua, colocaria um novo vestido ball's. para caminhar por a� fitando as pessoas nos olhos, bebendo caf� e comendo brigadeiro.

quer ouvir [ou ler] uma coisa boa? a tua felicidade me contagia e provavelmente em breve receberei uma liga�o da drogaraia [� a farm�cia], perguntando o q aconteceu para eu diminuir drasticamente a compra semanal de dorflex!

Papillon said...

adoro seus "textinhos" e desenhos de menina... que escreve com palavras de mulher...sardentinha...boneca de luxo com laço laranja na cabeça!!!!

Fe_licia

Gabi Sikorski said...

Faz alguns meses que acompanho o blog, mas só hoje me deu coragem de comentar.
Parabéns pelos lindos textos, pela emoção e pela veracidade transmitidas em cada acento.
Continue escrevendo sempre, vc não sabe como pode fazer bem a uma pessoa (:

beijos