Monday, May 25, 2009

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Passamos o domingo juntas.
Fazendo um filme.
Caetano, Vovó e eu.

Ela contou-me repetidamente de sua
infância e adolescência.
Falou muito sobre sua casa na capital,
do tempo em que a Tia Mariana cuidava dela.
Na rua Teodoro Sampaio e eu acho esta coincidência doce.
Hoje sou eu quem reside em Pinheiros.

"São Paulo é transitório minha filha. Cansa!"

Vovó me deu tristes relatos de solidão.

"Eu sou viúva!"

De ausência.
De tempo.
Muito tempo.
E a falta dele para com o restante
daqueles que habitam seu mundo.
Seus filhos e netos.

"Às vezes eles vem me visitar."

Mostrou-me suas roupas, seus brincos e broches.
Uma bolsa vazia.
Mostrou-me fotos que enfeitam a sala de estar
onde ela nunca mais havia sentado para bater um papo.

"A foto serve para relembrar..."

Sua casa, seu quarto, um banheiro.
Apresentou-me tudo, como se eu já não conhecesse e
da forma que ela percebeu o ambiente naquele exato instante.
Porque no minuto seguinte tudo pode mudar.
Assim é o Alzheimer com ela.
Faz tudo transformar, recodificar, reorganizar.
E de repente aquela casa não está ali,
a filha dela não é aquela e Luiza não sou eu.

"Não... Você não é a Luiza.
É parecida com ela, mas não é ela!"

E por aí vai a confusão.
Ou melhor, a fusão de todas as histórias que vovó já viveu.
Seu filho vira seu irmão, o genro vira primo,
seu pai passa a ser marido e sua mãe Lydia,
por incrível que pareça, está aqui entre nós.

_Viva vó?
_Vivinha da silva! Graças à Deus!

E quem sou eu para explicar-lhe as verdades dessa vida.
Nossa conversa durou mais de três horas.
Seguidas.
Gravadas em fitas.
Imutáveis.
Amáveis.
Publicáveis.
E nossas.

Necessárias.
No caminho de volta para casa
percebi com tristeza que com a doença
as pessoas deixaram de conversar com a Dona Edna.
De fato, nossos diálogos não chegam a nenhum lugar.
Comum só o amor.
Se isso lhe basta...

2 comments:

Tatiana Bandeira said...

Luiza, que diálogos tão lindos. Eu acho que eles levam para lugares alguns, vendo daqui, do ponto de vista de cá da tela. Do ponto de vista. Assim, imagino o Alzheimer, que, com toda tristeza embutida na doença, consegue ter também, dar também, outros viéses. Pode ser arrebatador e assustador. Pode.

eme bê, maria said...

lembrei de novo aqui de minha vó. não era alzheimer, mas no fim ela já estava confusa. mas continuava linda. e sabia que eu estava longe. e me falava pra não arranjar um marido em são paulo, pra poder voltar pra salvador. continuo obedecendo dona lila. e se soubesse que a saudade seria tão dolorosa, teria gravado milhares, milhões de fitas. mas consigo ouvir os diálogos ainda. aproveita a sua, bastante! beijo
:)